Por Manoel Dourado Bastos (diretor científico da Ulepicc-Brasil)
O que era uma ameaça em 2018 neste ano muito provavelmente se tornará realidade. Os cortes de bolsas do CNPq, em suas mais diversas modalidades, foi anunciado pela própria instituição nesta semana – não haverá concessão de novas bolsas e só há condições de pagar as atuais até o mês de agosto. O impacto será imenso, somado ao vazio deixado pelos cortes na CAPES ao longo de 2019. Qual a explicação para tamanho descalabro com a Ciência, a Tecnologia e a Inovação no Brasil?
Para entender a situação, é preciso caracterizar os elementos que levaram o CNPq ao déficit de R$ 330 milhões, que é o montante necessário para o pagamento até o fim do ano das bolsas já compromissadas, e indicar a decisão política diante da questão. Dois são os pontos: o déficit gerado pelo Teto de Gastos e o Crédito Suplementar necessário para corrigi-lo.
Primeiro, é preciso indicar o funcionamento do Orçamento da União desde a institucionalização legal do Teto de Gastos por meio da Emenda Constitucional 95, a famigerada PEC do Fim do Mundo. Com essa maravilha legislativa legada pelo usurpador Michel Temer, em 2017, as unidades da administração pública passaram a ter como teto de recursos o limite do que foi autorizado a pagar no ano anterior. Isso significa dizer que o contingenciamento de um ano implica num limite para o ano seguinte, numa clara perda orçamentária. Ou seja, o déficit de R$ 330 milhões já era de conhecimento do CNPq e demais agentes do setor.
Este déficit só pode ser corrigido mediante um Crédito Suplementar, visando aumentar a base orçamentária do CNPq. Tal ação só pode ser feita pelo Poder Executivo (no presente momento, leia-se, infelizmente: Jair Bolsonaro), mediante um PLN (Projeto de Lei do Congresso Nacional). Para isso, o governo manda ao Congresso Nacional um PLN de crédito suplementar a fim de ampliar um orçamento específico, mas necessariamente indicando de qual unidade orçamentária o dinheiro será retirado. Não é um dinheiro a mais no cômputo geral do orçamento, mas um remanejamento de recurso. O orçamento, como um triste cobertor curto, deixa os pés descobertos quando é puxado para cobrir a cabeça.
Atualmente, existem 13 PLNs no Congresso Nacional (relativos ao Poder Judiciário, Petrobras, Forças Armadas, Seguridade Social…), mas nenhum deles referentes ao CNPq. Trata-se, obviamente, de um projeto político muito bem direcionado do governo Bolsonaro. Assim como ocorreu com a CAPES, que foi incentivada a cortar bolsas desde o começo do ano, o CNPq tem sido pressionado para a mesma situação – o que, ao que tudo indica, só fez após alguma resistência. Ademais, mesmo que tenhamos um crédito suplementar esse ano, o problema persiste em 2020, já que a suplementação não conta para o aumento do teto para o ano seguinte.
Ou seja, enquanto houver o Teto de Gastos, o estrangulamento será cada vez pior, forçando as unidades a trabalhar com um orçamento cada vez menor até o completo colapso. No bojo do governo Bolsonaro, o CNPq ruma para o ocaso absoluto, provavelmente minguando até um ajuste em sua alocação e destinação. Eis a política de CT&I para o Brasil. Não por acaso, o Future-se é obra do MEC, que devia dar conta especificamente da atividade de ensino superior, mas resolveu se meter de cabeça nos rumos da CT&I no país.
Só a resistência não basta mais. Ou reagimos ou desapareceremos.
A Ulepicc-Brasil, junto com a Sociedade Brasileia para o Progresso da Ciência (SBPC) e outras entidades científicas do Brasil, formularam um abaixo-assinado “Em defesa dos recursos para o CNPq e contra a sua extinção.” Assine em: http://chng.it/CSJb8bkVvn