A SOCICOM e as Associações Científicas e Acadêmicas do Campo da Comunicação abaixo assinadas, vêm a público repudiar a Portaria 2.227 publicada pelo Ministério da Educação no dia 31 de dezembro de 2019 e que “dispõe sobre os procedimentos para afastamento da sede e do país e concessão de diárias e passagens em viagens nacionais e internacionais, a serviço, no âmbito do Ministério da Educação”.
O documento configura-se como uma normatização de extremo controle e visa, notadamente, limitar o acesso dos servidores/professores/cientistas/pesquisadores a eventos de diversas naturezas, em que apresentam o resultado de suas pesquisas e em que, ao mesmo tempo, mantém interlocução com os pares, objetivando o aprimoramento e a troca de conhecimentos.
A Portaria 2.227 além de potencializar a burocracia dos deslocamentos nacionais e internacionais que agora passam todos pela vigilância e total controle do MEC, define no Capítulo XVI das Disposições Finais, em seu Artigo 55 que a “ participação de servidores em feiras, fóruns, seminários, congressos, simpósios, grupos de trabalho e outros eventos será de, no máximo dois representantes para eventos no país e um representante para eventos no exterior, por unidade, órgão singular ou entidade vinculada”. E vai além no Parágrafo Único do mesmo Artigo, ao detalhar que somente o Secretário-Executivo do MEC poderá autorizar um número maior de participantes em eventos, desde que devidamente justificado.
Já o Artigo 62, embora delegue competência “aos dirigentes máximos das universidades, institutos federais e demais autarquias, fundações e empresas públicas vinculadas ao MEC para autorizarem, no âmbito de suas respectivas entidades, o afastamento da sede e a concessão de diárias e passagens para deslocamentos nacionais e internacionais […]”, o faz dentro do que dispõe a presente Portaria, não permitindo, na prática, que as Instituições Federais tenham liberdade para autorizar um número de afastamentos superior, mesmo que seja do interesse das Universidades e seus Programas de Pós-Graduação, por exemplo.
Vale, portanto, ponderar que o Artigo 55 da Portaria 2.227/19 fere o Artigo 207 do Capítulo III da Constituição Federal, que diz que as “ Universidades gozam de autonomia didático-científica, administrativa e de gestão financeira e patrimonial, e obedecerão ao princípio de indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão”; visto que limita a liberdade de gestão das Instituições Federais, por um lado, e, por outro, objetiva destruir a tridimensionalidade do conhecimento e os vínculos indissociáveis entre ensino, pesquisa e extensão, limitando inicialmente a visibilidade da produção científica das IFES, e objetivando a médio prazo coibir ações de pesquisa no âmbito das Universidades Federais, responsáveis pela maior parte da produção científica do Brasil.
Tal medida tem a intencionalidade clara de desarticular o sistema de produção e circulação de conhecimento em nosso país, potencialmente articulado pela rede de associações científicas que fomentam a pesquisa e fazem circular o conhecimento entre os públicos de interesse e a sociedade, a partir de eventos, revistas científicas e demais publicações.
Os eventos científicos serão prejudicados, tanto quanto os pesquisadores. E mais, a Portaria em pauta, também desarticulará as redes nacionais, uma vez que são compostas por grupos e/ou núcleos de pesquisa que trabalham com temáticas e observáveis comuns, logo a imposição do controle e restrição da participação de pesquisadores nos encontros das redes, intenciona quebrar a “coluna vertebral” da construção do conhecimento em nosso país.
Esse movimento imperativo contraria a política nacional de pós-graduação que, por sua vez, impõe produtividade anual aos docentes/pesquisadores e avalia os programas, além de fomentar a participação em redes nacionais e internacionais de pesquisa, configurando, inclusive, a necessidade de internacionalização da produção cientifica.
O Ministério da Educação no atual Governo segue em seu firme propósito de desmantelar o sistema público de ensino superior construído ao longo de décadas, assim como de desarticular toda a cadeia de construção da pesquisa, direcionando a política nesse âmbito, para uma atuação mercadológica, o que limitará o acesso da população mais pobre às universidades, como também, restringirá as investigações científicas ao interesse do mercado.
Pelo exposto repudiamos e conclamamos as forças democráticas brasileiras a agir contra tal medida que se configura como uma imposição autoritária.
São Paulo, 21 de janeiro de 2020
SOCICOM – Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação
As associações foram elencadas em ordem alfabética:
ABCIBER – Associação Brasileira de Pesquisadores em Cibercultura
ABEJ – Associação Brasileira de Ensino em Jornalismo
ABP2 – Associação Brasileira de Pesquisadores em Publicidade
ABPCOM – Associação Brasileira de Pesquisadores e Comunicadores em Comunicação Popular, Comunitária e Cidadã
ABRAPCORP – Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas
ALCAR – Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia
COMPÓS – Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
FORCINE – Fórum Brasileiro de Ensino de Cinema e Audiovisual
INTERCOM – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares em Comunicação REDE FOLKCOM- Rede de Estudos e Pesquisas em Folkcomunicação
SBPJOR – Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo SOCICOM – Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação
SOCINE – Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual
ULEPICC – União Latina de Economia Política da Informação, Comunicação e da Cultura- Seção Brasil