As Instituições Acadêmicas e Científicas do Campo da Comunicação abaixo assinadas, perplexas e indignadas diante das reiteradas ameaças à imprensa livre e democrática, por parte do governo do presidente Jair Bolsonaro, vem a público repudiar tal conduta governamental e reiterar a necessária liberdade ao campo jornalístico.
As ameaças começaram ainda no período da campanha. Em entrevista ao Jornal Nacional, em 2018, Bolsonaro ameaçou retirar verbas públicas dos veículos de imprensa que se comportassem de maneira “indigna”, e citou a Folha de São Paulo, como um desses casos.
No atual governo, ao acabar com a obrigação de empresas de capital aberto de publicar seus balanços em jornais, disse que estava retribuindo parte dos ataques que ele diz ter recebido da mídia e sugeriu que tal medida iria provocar o fechamento de alguns veículos de comunicação.
Mais recentemente, insinuou que poderia prender o jornalista americano Glenn Greenwald por divulgar, no site The Intercept Brasil, conversas privadas comprometedoras e de interesse público entre Sergio Moro e procuradores da Lava Jato. Ameaça que levou a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji) publicar nota em rede social dizendo que o presidente promove e instiga graves agressões à liberdade de expressão.
Em agosto de 2019, o presidente novamente ameaçou não mais conceder entrevistas à imprensa caso um assunto comentado por ele não fosse tema de reportagens “no dia seguinte”. A suposta notícia sugerida pelo presidente, porém, não era verdadeira. Bolsonaro mencionou de forma distorcida informações publicadas há quase dois anos pelo site The Intercept Brasil.
Em 7 de outubro disparou críticas e ofensas à imprensa, dizendo que o jornal Correio Braziliense agiu com “covardia e patifaria” ao publicar matéria sobre o projeto da reforma administrativa, que deve prever o fim da estabilidade para servidores públicos. Semelhante atitude teve diante da Folha de São Paulo, que divulgou reportagem mostrando indícios da investigação da Polícia Federal de que os recursos desviados no esquema de candidaturas laranjas do PSL em Minas Gerais foram usados para abastecer a campanha de próprio Bolsonaro, por meio de caixa dois. Disse que o Jornal foi “às profundezas do esgoto”.
A última das ameaças aconteceu esta semana. Em tom exaltado, o presidente chamou de “patifaria” a cobertura que a emissora Globo fez em 29 de outubro revelando que o seu nome fora citado na investigação do assassinato da vereadora Marielle Franco e do motorist a Anderson Gomes. Ao reagir a matéria, Jair Bolsonaro ameaçou não renovar a concessão da TV Globo e responsabilizou a mídia por notícias que tentam desestabilizar o seu governo.
Sempre que é confrontado com a realidade, o presidente radicaliza o discurso contra a imprensa. Quando surgem perguntas indesejáveis nas entrevistas, diz que vai encerrar a conversa e ainda acusa os jornalistas de perguntar besteiras. Em vários encontros com a imprensa demonstra ter dificuldades para seguir a liturgia do cargo que ocupa e que exige equilíbrio, serenidade, linguagem moderada e altivez. Invariavelmente desqualifica e desrespeita o trabalho jornalístico com o intuito de demonstrar que ele não tem importância e legitimidade na sociedade.
A imprensa exerce um papel social de alta responsabilidade e deve ser exercido com absoluta transparência e equilíbrio sob pena de ameaça à democracia e aos direitos de cidadãos por conta de etnia, credo, grau de instrução, posições político-ideológicas ou de estrato social a que pertençam.
De acordo com a Declaração de Chapultepec, da Sociedade Interamericana de Imprensa- SIP, e que reza sobre a liberdade de expressão e de imprensa, assinada pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (1996) e pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (2006), o exercício da liberdade de expressão e de imprensa “não é uma concessão das autoridades, é um direito inalienável do povo” e que “toda pessoa tem o direito de buscar e receber informação, expressar opiniões e divulgá-las livremente. Ninguém pode restringir ou negar esses direitos”. Determina o documento que “as autoridades devem estar legalmente obrigadas a pôr à disposiç&atild e;o dos cidadãos, de forma oportuna e equitativa, a informação gerada pelo setor público”.
Pedimos o cumprimento da Constituição Federal em seu artigo 220, ao estabelecer que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação sob qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição”. Princípio que garante o pluralismo de opiniões, instrumento essencial para a consolidação do estado democrático de Direito.
Lutamos para que os meios de comunicação social atuem com a menor interferência possível, de modo a prevalecer a livre manifestação do pensamento e o direito de informação. Quando há excessos como a divulgação de notícias não equilibradas, inverdades ou mesmo calúnias e infâmias defendemos que sejam igualmente combatidos.
ABEJ- Associação Brasileira de Ensino de Jornalismo
ALCAR – Associação Brasileira de Pesquisadores de História da Mídia
ABPCOM- Associação Brasileira de Pesquisadores e Comunicadores em Comunicação Popular, Comunitária e Cidadã
ABRAPCORP- Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação Organizacional e Relações Públicas
FOLKCOM- Rede de Estudos e Pesquisas em Folkcomunicação
INTERCOM- Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação
ULEPICC- BRASIL- União Latina de Economia Política da Informação, Comunicação e Cultura- Seção Brasil
SBPJOR- Associação Brasileira de Pesquisadores em Jornalismo
SOCICOM- Federação Brasileira das Associações Científicas e Acadêmicas da Comunicação